Saúde mental das juventudes periféricas é tema de pesquisa realizada em parceria entre Fundação FEAC, Minha Campinas e Unicamp
A desigualdade estrutural é um dos fatos constatados pelo levantamento Mapamentes das Juventudes que incluiu raça, gênero e vulnerabilidade social em suas abordagens
No momento em que o Plano Municipal das Juventudes começa a ser traçado em Campinas, a divulgação de uma pesquisa inédita realizada recentemente na cidade pode colaborar de maneira bastante estratégica. A parceria entre Fundação FEAC, associação Minha Campinas e Unicamp possibilitou o mapeamento de 33 iniciativas em territórios periféricos da cidade. O documento gerado pela pesquisa Mapamentes das Juventudes pretende contribuir para o acesso à informação e a compreensão da complexidade dessa questão em Campinas.
Os dados revelam desigualdades estruturais, como a predominância de lideranças brancas (45,45%) em contraste com o público atendido, majoritariamente negro (45%), além da sub-representação de pessoas trans nas coordenações das iniciativas. Entre as iniciativas mapeadas estão aquelas que, além do atendimento psicoterapêutico individual ou em grupo, também realizam práticas e atividades esportivas, culturais, de promoção da garantia de direitos, ações de combate ao racismo, LGBTQIA+ fobia, e violências sexuais e de gênero. “As juventudes vivem hoje um cenário de intensificação das vulnerabilidades e desigualdades sociais. Quando falamos de saúde mental, não podemos ignorar que fatores sociais, políticos e econômicos impactam diretamente as possibilidades de cuidado e bem-estar. Ter dados sólidos e referências qualificadas é essencial para orientar políticas públicas e promover iniciativas que tragam mudanças concretas e efetivas”, afirma Joyce Setubal, coordenadora de projetos da Fundação FEAC
A pesquisa, realizada entre outubro e novembro de 2024, utilizou um formulário online desenvolvido em parceria com o Departamento de Demografia da Unicamp, destacando a importância de abordagens que considerem raça, gênero e vulnerabilidade social de forma interseccional. Para divulgar e debater os dados apurados neste levantamento, será realizado um encontro aberto e gratuito no dia 26 de setembro, às 9h, na sede da Guardinha Campinas (Av. das Amoreiras, 165). Os interessados em participar podem ser inscrever até 19 de setembro pelo link https://actionnetwork.org/events/lancamento-relatorio-mapamentes/.
Dados ampliados
“As respostas dos participantes reforçam que a saúde mental é um conceito multidimensional, influenciado por condições de vida, racismo e acesso a direitos básicos. O relatório não apenas evidencia essas dinâmicas, mas também subsidia a construção de políticas públicas mais equitativas, propondo estratégias para ampliar o alcance e o impacto das iniciativas existentes”, explica Elisa Muller, co-fundadora da associação Minha Campinas, entidade responsável por executar o levantamento.
Entre as atividades mais eficazes avaliadas pela pesquisa no que diz respeito à saúde mental dos jovens da periferia, estão as coletivas, como rodas de conversa, oficinas culturais e esportivas, que promovem bem-estar e senso de pertencimento, embora apenas 15,2% das organizações ofereçam atendimento clínico especializado. O financiamento para as atividades desse segmento também se mostrou um desafio crítico, com organizações formalizadas (com CNPJ) concentrando 87,5% dos recursos, enquanto os coletivos informais, muitas vezes mais próximos das necessidades locais, ficam à margem.
A inclusão do fator racial na pesquisa ganhou importância ao considerar o racismo como um fator determinante para as condições de saúde da população negra, reconhecendo que ele persiste, apesar de conquistas institucionais. A partir da análise dos dados levantados, as entidades envolvidas entendem que as iniciativas comunitárias são fundamentais para promover a saúde mental de jovens em territórios periféricos, mas há desafios que precisam ser enfrentados. Um deles é carência de iniciativas específicas para jovens adultos (18 a 29 anos). Outro é a compreensão limitada sobre o tema saúde mental, que ainda é frequentemente associado apenas a tratamentos terapêuticos.
Elisa Muller comenta que “a saúde mental da população é profundamente influenciada pelo contexto social, econômico, político, cultural e ambiental em que vive. Trata-se de um problema que transcende a esfera individual, sendo resultado de fatores complexos que afetam a coletividade. Para enfrentar esses desafios, é fundamental a implementação de políticas públicas eficazes, a criação de redes de proteção social robustas, a garantia de melhores condições de vida, a segurança alimentar e o fortalecimento do suporte comunitário”. A Minha Campinas, responsável pelo levantamento, é uma associação que promove a participação democrática em Campinas desde 2015, incentivando a participação popular nas tomadas de decisão através de tecnologias sociais e digitais.
Na opinião do professor Igor Cavallini Johansen, da Unicamp, este projeto representou uma colaboração fundamental entre a universidade, especialmente o Departamento de Demografia e o Núcleo de Estudos de População Elza Berquó (NEPO), com a Minha Campinas, contando com o apoio essencial da FEAC. “Como demógrafos, nosso foco foi fornecer o suporte técnico e científico para a elaboração do questionário, sua implementação online e a subsequente análise de dados, em total parceria com a Minha Campinas. A abordagem interseccional, que integrou raça, gênero e vulnerabilidade social, foi um diferencial importante que enriqueceu a coleta de dados”, afirma. Ele destaca também que este projeto reforça a importância de parcerias estratégicas além da universidade, permitindo a disseminação do conhecimento acadêmico e o aprendizado mútuo com iniciativas de grande relevância social, como o mapeamento de ações de saúde mental para jovens em Campinas. “Esperamos que esta seja a primeira de muitas colaborações frutíferas”, completa.
Serviço:
Apresentação da pesquisa Mapamentes das Juventudes
Quando: 26 de setembro, 6ª-feira, às 9h
Onde: Sede da Guardinha Campinas – Av. das Amoreiras, 165
Inscrições gratuitas até 19/09: https://actionnetwork.org/events/lancamento-relatorio-mapamentes/